FLÁVIO TAVARES
Debandada nas escolas
Proprietária do Instituto Pedagógico Lápis de Cor, a pedagoga Eliane Mingoni

Desde que o ano de 2016 começou, entre duas e três escolas particulares em Minas fecham as portas a cada semana. Especialmente no maternal e na educação infantil, nos estabelecimentos voltados para as classes C e D, os alunos sumiram e as matrículas só acontecem a conta-gotas. A debandada é mais um efeito da crise, e já colocou na rua entre 5 mil e 6 mil professores e funcionários. Com a escalada da inflação, o aumento do desemprego e a corrosão da renda, a conta das famílias já não fecha. E a única saída é transferir o filho da escola paga para a pública.

“A crise financeira provocou uma queda nas matrículas em todos os níveis, mas atingiu principalmente as escolas voltadas para o público infantil. Muitos pais perderam o emprego ou estavam inadimplentes e não conseguirão rematricular os filhos, o que é lamentável”, diz o presidente do Sindicato das Escolas Particulares de Minas Gerais (Sinep-MG), Emiro Barbini.

Segundo ele, com o orçamento apertado na nova realidade econômica do país, o sonho de dar ao filho um ensino de qualidade superior ruiu.

“As conquistas estão sendo engolidas porque os pais não aguentam mais arcar com a despesa, mesmo nos casos de estabelecimentos que cobram mensalidades mais baixas. Já perdi a conta de quantas escolas encerraram as atividades, mas são pelo menos duas a cada sete dias”, afirma.

O Hoje em Dia vem mostrando em reportagens a crise nas escolas, como a demissão de professores e a disparada da inadimplência (veja ao lado). De acordo com Barbini, em 2015, a falta de pagamento atingiu o patamar de 35% em algumas instituições, nível considerado altíssimo. “Isso torna o negócio insustentável. Não há possibilidade de sobrevivência financeira”, diz.

Outro dado que assusta é a quantidade de professores que saem da sala de aula direto para a fila do desemprego. “Uma parte também leciona na rede pública, e por isso não fica totalmente sem salário. Porém, para muitos, era a única fonte de renda”, destaca o presidente do Sinep-MG.

Especializados

Proprietária do Instituto Pedagógico Lápis de Cor, a pedagoga Eliane Mingoni (foto) conta que já teve 100 alunos. Hoje, eles não chegam a 70. “Tivemos que reduzir despesas e nos adequar ao novo cenário. Cortamos o quadro de professores auxiliares e os especializados, como os profissionais que ensinavam arte e música. Quem não faz o remanejamento financeiro não consegue continuar no mercado”, diz ela, que está à frente da escola do bairro Carlos Prates há 22 anos.

Para Eliane, as maiores vítimas da recessão foram mesmo as escolas voltadas para a criançada. “A mãe que deixava o filho em horário integral reduziu o tempo dele na escola. Tem pai de criança pequena que pediu até a ajuda de familiares para cuidar do menino e não ter mais que pagar pelo ensino”, detalha. Ainda há muitas famílias que recorreram às Umeis, instituições bancadas pela Prefeitura de Belo Horizonte.

A coordenadora do Jardim de Infância Padre Eustáquio, Júnia Resende, diz que a média de alunos caiu de 100 para 85. “Tivemos que dispensar funcionários. A gente depende do aluno para prosseguir”.

Particulares devem perder de 10% a 12% das matrículas

Como todo pai, o comerciante Alexandre Silva deseja o melhor para a filha Izadora, 10. Porém, com a crise, as vendas na farmácia despencaram e ele precisou conversar com a menina sobre uma mudança que aconteceria na vida dela. Iza deixará de conviver com amigos e professores que conheceu há cinco anos no colégio particular que estudava em Belo Horizonte. Agora, a criança vai para a escola pública.

Assim como os Silva, muitas famílias brasileiras, que há alguns anos realizaram o sonho de proporcionar aos filhos uma educação de padrão superior, agora se veem obrigados a fazer o caminho de volta.
Segundo previsão da Federação Nacional das Escolas Particulares (Fenep), a rede deve perder de 10% a 12% das matrículas em 2016 para as instituições públicas.

“O problema é que a transferência não ocorre pela melhoria na qualidade do ensino público, mas única e exclusivamente pela piora no bolso e no poder aquisitivo”, afirma a diretora da Fenep, professora Amábile Pacios.

Migração

Segundo ela, a migração atinge principalmente as classes C e D, justamente as que conseguiram pular de degrau, mas hoje dão um passo atrás.

“Mesmo com mensalidades mais baixas, os valores já não cabem mais no orçamento. O resultado é o fechamento de portas, além de professores e funcionários demitidos. Estamos engrossando a estatística dos desempregados no setor de serviços”, lamenta Amábile.

Para a diretora da Fenep, causada pelo ambiente político ruim e pela má gestão do governo, a crise econômica bloqueia a inserção das crianças no desenvolvimento educacional, com consequências perversas para essa geração.